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4.10.12

Aparências...ilusões...



Dois horizontes fecham nossa vida:

Um horizonte, — a saudade
Do que não há de voltar;
Outro horizonte, — a esperança
Dos tempos que hão de chegar;
No presente, — sempre escuro,—
Vive a alma ambiciosa
Na ilusão voluptuosa
Do passado e do futuro.

Os doces brincos da infância
Sob as asas maternais,
O vôo das andorinhas,
A onda viva e os rosais;
O gozo do amor, sonhado
Num olhar profundo e ardente,
Tal é na hora presente
O horizonte do passado.

Ou ambição de grandeza
Que no espírito calou,
Desejo de amor sincero
Que o coração não gozou;
Ou um viver calmo e puro
À alma convalescente,
Tal é na hora presente
O horizonte do futuro.

No breve correr dos dias
Sob o azul do céu, — tais são
Limites no mar da vida:
Saudade ou aspiração;
Ao nosso espírito ardente,
Na avidez do bem sonhado,
Nunca o presente é passado,
Nunca o futuro é presente.

Que cismas, homem? – Perdido
No mar das recordações,
Escuto um eco sentido
Das passadas ilusões.
Que buscas, homem? – Procuro,
Através da imensidade,
Ler a doce realidade
Das ilusões do futuro.

Dois horizontes fecham nossa vida.

Machado de Assis

Caminhos...


Caminhos

Para quê, caminhos do mundo,
Me atraís? — Se eu sei bem já
Que voltarei donde parto,
Por qualquer lado que vá.

Pra quê? — Se a Terra é redonda;
E, sempre, tem de cumprir-se
A sina daquela onda
Que parece vai sumir-se,

Mas que volta, bem mais débil,
Ao meio do lago, onde
A mãe, gota d'água flébil,
Há muito tempo se esconde.

Pra quê? — Se a folha viçosa
Na Primavera, feliz,
Amanhã será, gostosa,
Alimento da raiz.

Pra quê, caminhos do mundo?
Pra quê, andanças sem Fim?
Se todo o sonho profundo
Deste Mundo e do Outro-Mundo,
Não 'stá neles, mas em mim.

Francisco Bugalho, in "Paisagem"

3.10.12

A tua ausência...



Ausência

Eu haverei de erguer a vasta vida
que ainda é o teu espelho:
cada manhã hei-de reconstruí-la.

Desde que te afastaste,
quantos lugares se tornam vãos
e sem sentido, iguais
a luzes acesas de dia.

Tardes que te abrigaram a imagem,
música em que sempre me esperavas,
palavras desse tempo,
terei de as destruir com as minhas mãos.

Em que ribanceira esconderei a alma
pra que não veja a tua ausência,
que como um sol terrível, sem ocaso,
brilha definitiva e sem piedade?

A tua ausência cerca-me
como a corda à garganta.
O mar ao que se afunda.

Jorge Luis Borges